"Por muito que aja de forma estudada e consciente, o treteiro procura sempre passar algo de forma sub-reptícia e não controlada.
Há certamente no seu labor, tal como no do artesão negligente, uma espécie de laxismo que resiste ou evita a exigência de uma disciplina desinteressada e austera. O modo pertinente deste laxismo não pode ser assemelhado, como é óbvio, à simples falta de cuidado ou atenção ao detalhe...
...Mentir ou fazer bluff são ambos modos de distorção ou falácia. Ora, o conceito mais central á natureza específica da mentira é o de falsidade: o mentiroso é, essencialmente, alguém que divulga uma falsidade. Também fazer bluff implica uma intenção de comunicar algo falso. Contudo, ao contrário da mentira, o bluff é mais um caso de falsificação do que falsidade. È isto que o aproxima da treta. Porque o que caracteriza a essência da treta não é ser falsa, mas ser uma imitação, uma falsificação da verdade . Para compreender esta distinção temos que admitir que uma falsificação ou imitação não é necessáriamente inferior ao original, salvo no facto de não ser autêntica. O que não é genuíno não é obrigatoriamente defeituoso. Pode bem ser, afinal de contas, uma cópia fiel. O que está errado numa falsificação não é aquilo que ela é, mas sim o modo como foi feita. Isto aponta para um aspecto semelhante e fundamental na natureza da treta: embora seja produzida sem uma preocupação pela verdade, não tem que ser necessariamente falsa. O treteiro imita a aparência das coisas. Mas isso não significa que as represente mal."
Harry G. Frankfurt em Da Treta
Há certamente no seu labor, tal como no do artesão negligente, uma espécie de laxismo que resiste ou evita a exigência de uma disciplina desinteressada e austera. O modo pertinente deste laxismo não pode ser assemelhado, como é óbvio, à simples falta de cuidado ou atenção ao detalhe...
...Mentir ou fazer bluff são ambos modos de distorção ou falácia. Ora, o conceito mais central á natureza específica da mentira é o de falsidade: o mentiroso é, essencialmente, alguém que divulga uma falsidade. Também fazer bluff implica uma intenção de comunicar algo falso. Contudo, ao contrário da mentira, o bluff é mais um caso de falsificação do que falsidade. È isto que o aproxima da treta. Porque o que caracteriza a essência da treta não é ser falsa, mas ser uma imitação, uma falsificação da verdade . Para compreender esta distinção temos que admitir que uma falsificação ou imitação não é necessáriamente inferior ao original, salvo no facto de não ser autêntica. O que não é genuíno não é obrigatoriamente defeituoso. Pode bem ser, afinal de contas, uma cópia fiel. O que está errado numa falsificação não é aquilo que ela é, mas sim o modo como foi feita. Isto aponta para um aspecto semelhante e fundamental na natureza da treta: embora seja produzida sem uma preocupação pela verdade, não tem que ser necessariamente falsa. O treteiro imita a aparência das coisas. Mas isso não significa que as represente mal."
Harry G. Frankfurt em Da Treta
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